Com mais crédito, consumidor adota 'estilo americano', diz especialista.
A expectativa de crescimento acima de 5% da economia em 2010 deve liberar o "desejo represado" dos consumidores brasileiros. Na lista de desejos do consumidor nacional estão a renovação de televisão, geladeira, telefone celular e do computador.
Segundo o Ibope, trocar a televisão está nos planos de 6,4% dos brasileiros para os próximos 12 meses. Isso quer dizer que mais de 6 domicílios de cada 100 que possuem televisão pretendem comprar um aparelho novo ao longo de 2010.
Nesta mesma comparação, diz o instituto, a taxa de renovação das geladeiras deve ficar em 5,7%, enquanto a dos telefones celulares e computadores devem marcar, respectivamente, 4,7% e 3,8%.
Com exceção do computador, presente em 48% das residências brasileiras, os demais produtos estão em praticamente todos os domicílios, segundo o Ibope: a presença das geladeiras é de 97%; a da televisão chega a 98%; e a do fogão marca 99%. A entidade diz que 74% dos brasileiros já têm telefone celular.
O especialista em finanças pessoais Conrado Navarro, responsável pela campanha de consumo consciente dos cartões de crédito Mastercard, diz que a nova classe média (ou classe C), que hoje já representa mais de 50% da população, ganhou acesso a uma nova gama de bens.
Em tempos de expansão econômica, Navarro explica que o raciocínio do consumidor é de que as coisas devem continuar como estão. Desta forma, vai às compras, pois calcula que terá como honrar as compras que já fez. O problema, diz ele, é se as coisas não acontecerem como o planejado.
Sem reservas
Segundo Conrado, o brasileiro é um bom pagador, mas não tem reservas que permitam que os compromissos sejam honrados em períodos temporários de desemprego ou caso surjam gastos imprevistos, como uma doença.
O especialista prevê que, como ocorreu em 2009, o consumo das famílias deve voltar a "turbinar" o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. "O consumo é importante para a economia e deve ser estimulado, mas dentro da realidade das famílias."
Como o emprego deve se manter forte em 2010, o que deve garantir o fluxo de caixa para as famílias, a inadimplência tende a cair ao longo de 2010, de acordo com a empresa de monitoramento de crédito Serasa Experian.
"Neste ano, a inadimplência deve subir no início do ano, com as despesas com impostos [IPVA e IPTU] e escola [matrícula e material escolar], mas depois a expectativa é de queda", diz o assessor econômico da Serasa Experian Carlos Henrique de Almeida.
Os dados mostram que, em novembro de 2009, mês em que os brasileiros recebem a primeira parcela do 13º salário, a inadimplência teve queda de 1,8% em relação a outubro. "Como houve o crescimento do emprego com carteira assinada, esse fato colaborou para o pagamento de dívidas. [...] A tendência para 2010 é também de indicadores menores", explica a entidade.
Ferramentas de consumo
Entre "ferramentas" que ajudaram na expansão do consumo nos últimos anos, o cartão de crédito apresentou forte crescimento: segundo o Ibope, um levantamento feito entre 2004 e 2005 mostrava que 48% dos brasileiros tinham acesso ao produto; uma pesquisa mais recente, encerrada em 2009, mostra que o "dinheiro de plástico" já está presente em 57% das residências.
"O parcelamento no cartão de crédito tomou o lugar do cheque pré-datado", explica o economista da Serasa Experian.
Segundo a empresa, o cartão de crédito aumentou sua participação no endividamento das famílias. As dívidas com cartão de crédito e financeiras representavam 36% do total da inadimplência em novembro de 2009. No mesmo mês do ano anterior, a participação do meio de pagamento nas dívidas era de 33,5%.
Para o consultor Conrado Navarro, embora o consumo leve em conta fatores emocionais, as famílias precisam deixar o sentimento de lado e questionar se o desejo de consumo combina com o padrão de vida e de renda da família.
"O planejamento [de uma poupança] é para ser feito durante os tempos em que a economia vai bem e a pessoa está empregada", diz o especialista. Segundo ele, dar vazão ao "desejo represado" de consumo, transformando em necessidade imediata a compra de uma televisão mais moderna, por exemplo, pode abrir a porta para o endividamento.
Além da economia
Além da questão do envidividamento, o consumo exagerado pode trazer impactos sociais e ambientais, de acordo com Hélio Mattar, presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente.
Com base em pesquisas feitas pelo instituto, ele diz que o brasileiro tende a consumir mais – e com menos critério – em 2010, por causa do aquecimento da economia. Ele diz que a "demanda reprimida" por certos produtos e a mudança de tecnologia em outros, como a televisão, devem estimular as compras.
Com a introdução das TVs LCD e LED, muita gente pensa em trocar os aparelhos de casa. Segundo Mattar, boa parte desses produtos deve virar lixo. "O brasileiro está mais próximo da sociedade americana de consumo do que da europeia. Uma das características do consumo consciente é comprar um bom aparelho, de maior vida útil. É o descartável versus durável", explica.
Entretanto, nem toda a tecnologia é maléfica, de acordo com o presidente do Instituto Akatu. "Vale sempre trocar o tangível pelo intangível. Substituir o CD pelo 'download' de música e o livro pelo Kindle é uma atitude consciente. Você produz menos material físico, causa menos descarte e evita muito custo e emissões com o transporte deste material físico", ressalta.
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